sexta-feira, 29 de maio de 2020

Resenha de Vintage Dixon, The Real McCoy


Imagine se você tivesse tanto a linhagem do maior compositor de blues da história quanto a experiência de ter aprendido tudo com ele próprio. O que você faria? Tentaria outro caminho ou aproveitaria a bagagem biológica e cultural para manter a tradição viva? 


Esse é o caso de Alex Dixon, neto do grande e incomparável Willie Dixon, sem dúvida o primeiro compositor profissional de clássicos de blues – e o maior até hoje. Enraizado nas tradições orais da comunidade negra no sul dos Estados Unidos, as músicas passavam de cantor para cantor, que adicionavam um verso aqui, outro ali, tornando a noção de direitos autorais e composição algo muito difícil de localizar. Mas Willie Dixon está diretamente ligado à fase de ouro do blues dos anos 50, principalmente quando aliado a Leonard Chess, um dos fundadores da Chess Records, que seria o epicentro de gravações memoráveis do blues, em Chicago. Willie Dixon seria o compositor oficial que criava e pensava músicas especialmente para seus intérpretes. Por exemplo, músicas como “Spoonful”, “The Little Red Rooster”, “Back Door Man” foram feitas sob medida para um intérprete com as características de Howlin’ Wolf, enquanto “Hoochie Coochie Man”, “The Same Thing”, “I Just Want To Make Love to You”, “You Shook Me” se encaixam perfeitamente com Muddy Waters, “My Babe” com Little Walter, “I Can’t Quit You Baby”, com Otis Rush, “Bring it On Home”, com Sonny Boy Williamson e inúmeros outros casos. Perceberam o nível das músicas? Pois bem, todas elas são de Willie Dixon, músicas que foram reinterpretadas por bandas como Led Zeppelin, Bob Dylan, The Doors, Rolling Stones, Cream, Eric Clapton, The Allman Brothers e centenas de outros. Mas não estamos aqui para falar de Willie, mas sim do seu neto, Alex Dixon, que acabou de lançar um disco do seu novo projeto, Vintage Dixon, chamado The Real McCoy.


Assim como seu avô, Alex Dixon também é baixista e compositor, mas também toca outros instrumentos, como piano. Alex foi criado por seu avô e aprendeu muito com ele. É esse legado da família que Alex quer homenagear com a nova banda Vintage Dixon. A banda é formada por Lewis “Big Lew” Powell nos vocais, Alex no baixo baixo, o filho de Carey Bell, Steve Bell, na gaita, Alvino Bennett na bateria e Melvin Taylor e Gino Matteo nas guitarras. O disco The Real McCoy é composto por sete músicas originais, escritas pelo próprio Alex, e quatro covers conhecidas do catálogo de Willie Dixon.




Os destaques ficam a cargo de “Nothing New Under The Sun”, um shuffle poderoso acompanhado por “Spider In My Stew”, “My Greatest Desire” um blues mais lento cheio de gaitas incríveis. Dentre as covers, as que mais se destacam são dos intérpretes mais memoráveis de Willie, “Howlin’ for My Darlin”, gravada por Howlin’ Wolf, e “I Want to Be Loved”.
Enfim, The Real McCoy é puro Chicago Blues com um pé no passado e outro no presente. Aproveitemos.

Rick Estrin & The Nightcats tem uma mensagem para todos os americanos: "Dump That Trump"

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        Mesmo em meio à pandemia, o processo eleitoral nos Estados Unidos está com toda força. Vários nomes do cenário do blues aproveitaram para mandar um recado para literalmente despejar Trump do cargo de presidente dos Estados Unidos. A música gravada por Rick Estrin & The Nightcats é uma atualização do clássico “Dump That Chump”, traduzindo, despeje esse idiota. O que Rick fez foi nomear o idiota em questão. “Dump That Trump”. Para o Brasil poderíamos muito bem adaptá-la ainda mais. “Dump That Bolsonaro”. Que tal?

No final do vídeo tem uma mensagem do Nightcats na placa do Signs of Justice, que diz que “nós acreditamos que a vida dos pretos importam, nenhum ser humano é ilegal, amor é amor, direitos das mulheres são direitos humanos, a ciência é real, água é vida, injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar”. Vários artistas do blues aproveitaram o gancho pra mandar sua mensagem de expulsar Trump do cargo. São mais de cinquenta que incluem Charlie Musselwhite, Kim Wilson, Elvin Bishop, Joe Louis Walker, Alabama Mike, Lucky Peterson, Big Harp George, Nick Moss, dentre outros.

Vale a pena conferir. Espero que contamine os eleitores e realmente coloquem para fora Trump e o movimento siga expulsando todos os líderes autoritários de extrema-direita, fascistas, que se alastram pelo mundo, inclusive aqui nesse país tropical chamado Brasil.


sexta-feira, 8 de maio de 2020

Há 109 anos, nascia Robert Johnson



        O que The Rolling Stones, Eric Clapton, Led Zeppelin, Jimi Hendrix, Bob Dylan, The White Stripes, The Who e muitos outros têm em comum? Todos eles foram influenciados por Robert Johnson, que nasceu em 8 de maio de 1911, no Mississippi, berço do blues. Sem Johnson o blues, o rock e pode-se dizer que a música pop em geral não seriam os mesmos. Sua influência vai muito além da carreira curta e com poucas músicas gravadas, marcando profundamente imaginários e mitos de longa duração na música pop.
        De carreira meteórica, Johnson tem apenas duas fotos conhecidas e gravou apenas 40 músicas em duas sessões; uma em San Antonio, em novembro de 1936 e Dallas, em julho de 1937, gravações cheias de ruídos e chiados. Entre elas, clássicos eternos como “Cross Road Blues”, “Walkin’ Blues”, “Love In Vain”, “Ramblin’ On My Mind”, Sweet Home Chicago”, “Stop Breakin’ Down”, revisitadas inúmeras vezes por uma variedade indizível de artistas cujo tamanho só aumenta.
        No campo do imaginário, Johnson contribuiu fortemente em dois mitos que marcaram a cultura pop até hoje. Quem já ouviu a história de vender a alma ao diabo em nome de uma habilidade que ninguém mais tem? Pois bem, reza a lenda que Robert Johnson, guitarrista de mediano pra ruim, encontrou-se com o capeta em uma encruzilhada das rodovias 61 e 49, em Clarksdale, onde acabou acertando o acordo. O fato é que pouco tempo depois Johnson reaparece com uma habilidade incrível na guitarra, chamando rapidamente a atenção de todos na região. O outro mito é o tal do “clube dos 27”, artistas famosos que tiveram a vida encurtada por alguma tragédia. Kurt Cobain, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Amy Whinehouse são membros do clube que muito antes deles já tinha Robert Johnson provavelmente se divertindo entre uma dose de uísque e outra. Como tudo na vida de Johnson, sua morte é bastante controversa. A teoria mais aceita é que ele bebeu um uísque envenenado depois de paquerar com a mulher do dono do bar, tendo morrido depois de pneumonia em 16 de agosto de 1938, com 27 anos. Outras teorias dizem que morreu de sífilis, assassinado, envenenado pelo próprio uísque, etc.
        Por fim, o mito que, ele mesmo, se tornou.



segunda-feira, 4 de maio de 2020

Os vencedores do 41º Blues Music Awards



A noite de gala do mundo do blues foi bem diferente neste ano. Devido à pandemia do coronavírus, não tinha como fazer o evento de cinco horas de duração, tomado de gente, com apresentações ao vivo e tudo o mais. Como tem sido nesse período de distanciamento social, o 41º Blues Music Awards foi transmitido ao vivo pelas redes sociais e teve apresentações remotas de casa de vários artistas que ganharam destaque durante o ano passado.

O grande vencedor da noite foi o estreante Christone 'Kingfish' Ingram, que levou pra casa cinco prêmios, dentre eles o mais desejado álbum do ano, com o disco de estréia Kingfish (os outros prêmios foram Melhor álbum de artista jovem, melhor álbum de contemporary blues, e, individualmente, melhor guitarrista e melhor artista de blues contemporâneo. Nick Moss faturou dois troféus com o disco Lucky Guy! (banda do ano e melhor álbum de blues tradicional). Bobby Rush, que se recuperou recentemente da covid-19, também ganhou prêmios na noite. Confira a lista de vencedores completa abaixo:

Acoustic Album of the YearThis Guitar and TonightBob Margolin
Acoustic Artist of the YearDoug MacLeod
Album of the YearKingfishChristone Ingram
B.B King Entertainer of the YearSugaray Rayford
Band of the YearThe Nick Moss Band featuring Dennis Gruenling
Best Emerging Artist AlbumKingfishChristone Ingram
Contemporary Blues Album of the YearKingfishChristone Ingram
Contemporary Blues Female Artist of the YearShemekia Copeland
Contemporary Blues Male Artist of the YearChristone Ingram
Instrumentalist - BassMichael "Mudcat" Ward
Instrumentalist - DrumsCedric Burnside
Instrumentalist - GuitarChristone Ingram
Instrumentalist - HarmonicaRick Estrin
Instrumentalist - HornVanessa Collier
Instrumentalist - VocalsMavis Staples
Pinetop Perkins Piano PlayerVictor Wainwright
Koko Taylor Award (Traditional Blues Female)Sue Foley
Blues Rock Album of the YearMasterpieceAlbert Castiglia
Blues Rock Artist of the YearEric Gales
Song of the Year"Lucky Guy", Nick Moss
Soul Blues Album of the YearSitting on Top of the BluesBobby Rush
Soul Blues Female Artist of the YearBettye LaVette
Soul Blues Male Artist of the YearSugaray Rayford
Traditional Blues Album of the YearLucky Guy!The Nick Moss Band featuring Dennis Gruenling
Traditional Blues Male Artist of the YearJimmie Vaughan

sábado, 2 de maio de 2020

Resenha de 11 Guys Quartet - Small Blues and Grooves




        Quando se fala em álbum instrumental a gente pensa logo em alguma big band ou algum instrumentista extremamente virtuoso de jazz. O que pensar, então, de um disco instrumental totalmente de blues? Bem, essa é a proposta do grupo 11 Guys Quartet, que lançou o trabalho Small Blues and Grooves, um projeto que ficou mais de dez anos na geladeira e que só veio à tona em 2020. Vamos falar primeiro da banda. Há quase quarenta anos quatro caras se uniram e resolveram se divertir tocando em bares na área de Boston. Eles misturavam rock e blues e eram chamados de 11th Hour Blues Band. Esses caras eram Paul Lenart, na guitarra, Bill “Coach” Mather, no baixo, Chuck Purro, na bateria, e Richard “Rosy” Rosenblatt na gaita. Eles chegaram a gravar um disco em 1985, Hot Time In The City Tonight. Avançando para 2008, o grupo se reuniu novamente no estúdio e gravaram um monte de músicas instrumentais que eles tinham composto. O material nunca chegou a tornar-se público... até hoje.


        Pois bem, vamos retomar a pergunta inicial: o que pensar de um disco instrumental totalmente de blues? Os mais apressados poderiam achar que seria algo repetitivo demais. Ledo engano. Tem slow blues, shuffle, boogie e muito mais. “Read Trippin’”, que abre o disco, tem o DNA de Freddie King; “Sleepless” e “Down and Dirty” são slow blues da melhor qualidade; “Swing Low” certamente fará você querer dançar, etc.; Outros poderiam pensar que para dar certo precisaria de mais elementos, para dar uma refinada maior no som. Erro crasso. É incrível como o básico de guitarra/baixo/bateria/gaita consegue revisitar toda uma variedade de estilos do blues de forma tão autêntica. Sem soar injusto com os demais integrantes, pode-se afirmar que a gaita funciona como a verdadeira voz do grupo, ditando o ritmo e a direção das emoções e sensações. Por essa razão, esse álbum é especialmente indicado para quem é fã de gaita. Mas isso não significa que não tenha algumas momentos inspiradores guiados pela guitarra, como em “Four Maypops” e “Doggin’ It”.

        Por fim, Small Blues and Grooves é a trilha sonora perfeita pra aquele dia em que você senta pra relaxar com os amigos, bater aquele papo e tomar aquela boa cerveja gelada com um som ambiente agradável do início ao fim.

sexta-feira, 1 de maio de 2020

Resenha de John Primer & Bob Corritore - The Gypsy Woman Told Me



        O primeiro disco da enxurrada de que falei no post anterior finalmente saiu e já podemos adiantar que cumpriu todas as promessas. John Primer e Bob Corritore, pela terceira vez, fazem justiça à fama e à posição que conquistaram no mundo do blues. John Primer, guitarrista e um dos maiores representantes contemporâneos do Chicago Blues, que já tocou com Muddy Waters, Junior Wells e Magic Slim, e Bob Corritore, o incansável especialista e super produtivo mestre da gaita, seguem a fórmula de sucesso anterior e dividem as atenções no novo disco, The Gypsy Woman Told Me, lançado hoje nas plataformas de stream. Além da dupla, o álbum conta com uma lista de colaboradores de primeira: Billy Flynn, Bob Welsh, Kid Andersen são apenas alguns desses nomes. 



        O álbum é empolgante do início ao fim e o repertório também é incrível, mesclando músicas novas, como “Little Bitty Woman” e “Walked So Long”, com versões a maior parte delas tiradas do fundo do baú e desconhecidas, como a faixa que abre o disco, “Keep-A-Driving”, de Chick Willis’ e “I Got The Same Blues”, de J.J. Cale. Mas também tem Jimmy Reed, “Let’s Get Together” e Sonny Boy Williamson, “My Imagination”, que serve perfeitamente para a gaita de Corritore brilhar. Mas a mais conhecida certamente é a música que dá título ao álbum, “The Gypsy Woman Told Me”, clássico de Muddy Waters. Tem músicas pra dançar batendo com os pés no chão, tem músicas para ficar soprando o ar lentamente com a gaita imaginária e também muitos temas já tradicionais no imaginário do blues, como o errante jogador que perde tudo, em “Gambling Blues”, o solitário de coração partido, o azarado, enfim, todos os ingredientes para compor um disco de blues completo.

        Normalmente, um disco crava duas ou três músicas na playlist do Filho do Blues. Aqueles discos que no final do ano vão brigar pelo topo da lista dos melhores do ano chegam a levar umas cinco a seis faixas para a playlist. Bem, esse é o caso de The Gypsy Woman Told Me, um disco para fazer vibrar tanto fãs novos quanto fãs mais puristas de blues.