sábado, 7 de dezembro de 2013

Resenha de Mundo Livre S.A & Nação Zumbi - Mundo Livre vs Nação Zumbi


Ótimas ideias geralmente já são garantias de um grande disco, sobretudo quando vem acompanhado de uma produção bem feita e uma execução impecável. É a combinação perfeita. Some-se a isso a união de forças de duas das maiores bandas do último movimento musical genuinamente brasileiro, o Manguebeat. Essa é a ideia por trás do disco Mundo Livre vs Nação Zumbi, segunda edição da série "Embate do Século", promovido pela gravadora Deskdisc e que, a despeito do título sugerir uma rivalidade inexistente, o trabalho soa mais como uma colaboração pensada nos mínimos detalhes, cada um com o intuito de produzir o melhor para destacar o trabalho da banda colega. 

O disco é composto por quatorze faixas, das quais sete são originalmente de Mundo Livre S.A e as sete restantes ficam a cargo de Nação Zumbi. Naturalmente, as faixas escolhidas são as que mais definiram a história da banda, as de maiores sucesso e representatividade de suas carreiras. Mas o negócio fica realmente interessante quando Nação Zumbi toca as músicas de Mundo Livre S.A e vice-versa. E é esse exatamente o grande trunfo do disco, pois é empolgante ver as músicas com uma nova roupagem, cada uma com as características principais de cada uma das bandas. Isso gera uma experiência completamente nova e inesperada na audição de músicas que estamos acostumados a ouvir inúmeras vezes no decorrer dos anos. 





Dito isto, vamos nos deter nas execuções que mais encarnaram esse princípio da maneira mais bem sucedida. O disco é virtualmente dividido em duas metades, a primeira sendo conduzida por Fred 04 e companhia, com o Mundo Livre S.A. Logo de início, na faixa de abertura, um dos ícones do movimento Mangue, "A Cidade", Fred 04 relembra e homenageia o homem-carangueiro, Francisco França, vulgo Chico Science. "No início dos anos 90, Francisco França falou..." e começa com seu cavaquinho e vocal característico. "A Praieira" foi totalmente reformulada, num sambinha bossa nova que fica quase irreconhecível da original, com o furor e a excitação dando lugar a uma calma e bucólica faixa. Quase como se a original fosse feito num domingo de sol em Boa Viagem, com a praia lotada, enquanto que agora Fred 04 foi para alguma praia deserta no litoral pernambucano, tomando uma cerveja antes do almoço, debaixo de uma palhoça, pois "há fronteiras nos jardins da razão". Genial. "Etnia" é outra icônica do movimento e Fred 04 volta ao samba. "Meu Maracatu Pesa Uma Tonelada" é um dos destaques máximo do disco. A original, de Nação Zumbi, já é incrível e essa versão é tão boa e intrigante que não se sabe realmente qual é a melhor. Com o peso sendo acrescentado por uma voz quase robótica. Do repertório de Mundo Livre, ainda destacam-se obviavelmente, "Rios, Pontes e Overdrives", um intenso samba\punk e "Samba Makossa", sempre com a irreverência típica de Fred 04 e sei jeito de cantar. 

 Esse comércio de competências e habilidades somente é completo quando Nação Zumbi entra em jogada, que assume também a partir de uma das icônicas faixas de Mundo Livre, "Livre Iniciativa". A partir de então, os batuques, guitarras com efeitos e arranjos psicodélicos e a seriedade do vocal de Jorde Du Peixe tomam conta. Essa química entre as características das bandas dão o charme e a genialidade dos discos. Ambas as bandas conhecem-se perfeitamente e só a partir disso que se é capaz de mergulhar por territórios diferentes para recriar a música. “Musa da Ilha Grande” também é outro grande destaque, seguida de “Bolo de Ameixa”, com um grande riff de guitarra, somado ao peso dos tambores. Dizer que a performance de um é melhor do que o outro seria injustiça certa para uma das partes. Enquanto que a tracklist de Nação está mais coesa e unida, Mundo Livre S.A preferiu a diversidade musical, ou seja, ambos ganham. 





“Girando em Torno do Sol” ganha uma roupagem de balada, sem as guitarras distorcidas da original. Depois de “Pastilhas Coloridas”, as duas faixas finais se sobressaem, deixando-nos no mesmo dilema, sem saber qual seria a melhor, a original ou a nova versão. “Seu Suor É o Melhor de Você” destaca-se na discografia de Mundo Livre como uma das melhores de sua carreira, o que torna a responsabilidade de Nação Zumbi em regravá-la ainda maior. Mas diante da obrigação, eles se saem muito melhor do que o esperado. Colocam uma tensão nos novos arranjos. Por fim, o frevinho genial de “O Velho James Browse Já Dizia”, que é digna de ser tocada inúmeras vezes no carnaval de Olinda. 

Esta série de “Embate do Século” ganha não somente mais um capítulo, mas também contribuiu para produzir um dos registros mais interessantes da música brasileira recente. Mesmo que sejam regravações de clássicas músicas, o nível de ineditismo aqui é de surpreender e de agradar. E muito.


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