Por diversos
motivos, emocionais, artísticos/estéticos e políticos, o rock vem me
decepcionando nos últimos anos, sobretudo após a morte repentina de David
Bowie, o que pode não ter nada a ver, mas para mim foi um marco referencial. Para
agravar a situação, outras bandas que eram referências para mim foram
decepcionando a cada novo lançamento. Arcade Fire, Queens Of The Stone Age, são
só dois grandes exemplos dessas bandas que acabaram cedendo a tendências do
mundo pop e eletrônico, especialmente uma onda new-wave, que, ironicamente, era
bastante influenciada pelos experimentos de Bowie. Ao saber que Pearl Jam iria
lançar um novo álbum, o primeiro desde Lightning Bolt, de 2013, confesso que
fiquei receoso que a banda abriria mão do seu estilo clássico e cederia às
exigências do mundo fonográfico em busca de ampliar seu público. O mundo já não
seria mais o mesmo: David Bowie estava vivo e surpreendendo o mundo como
sempre, com o disco The Next Day, Arcade Fire lançava Reflektor, e Queens Of
The Stone Age completava o belo ano musical com ...Like a Clockwork. Por fim, esse
receio veio acompanhado de um calafrio ao ouvir o primeiro single de Gigaton,
nome do novo disco, “Dance of The Clairvoyants”, que reúne todos os elementos
que temia. Mas nada como um dia após o outro. Gigaton é um dos discos mais
ricos e interessantes da banda, que já tem em seu catálogo grandes clássicos
desde a década de 90.
A partir da
capa de Gigaton e através de suas músicas, percebe-se claramente a preocupação
de Pearl Jam com a política, em especial o tema do meio ambiente. A variedade
de sons é bem grande, mostrando a experiência e a riqueza do percurso em três
décadas de carreira. Tem as faixas mais pesadas, no estilo clássico, outras
mais experimentais e introspectivas, bem como acústicas.
O disco começa
com “Who Ever Said”, mostrando já de início toda a energia que a banda ainda
dispõe ao afirmar que ainda tem o que dizer, pois, como diz a letra, “quem
disse que tudo já foi dito abriu mão da satisfação”. A música também conta com
variações rítmicas bem interessantes. “Superblood Wolfmoon”, outra bastante
rápida e pesada, os riffs de guitarra estão bem definidos e acompanhados aqui
por um belo solo. Essa dupla inicial certamente agrada os fãs mais antigos, que
exigem muita guitarra e energia de Eddie Vedder. É porque o oposto vai
acontecer agora com a faixa seguinte, “Dance of The Clairvoyants”, a viagem da
banda pelo experimento new-wave.
Após o
delírio, uma rápida fuga, é o que se trata de “Quick Escape”, muito peso e
riffs novamente e uma letra pessimista sobre os caminhos que estamos tomando, cutucando
o presidente dos Estados Unidos, com a pessoa indo de um lugar para outro em
busca de um lugar onde Trump ainda não tinha fudido tudo. As coisas se acalmam
com a belíssima “Alright”, sobretudo num mundo onde a vida está cada vez mais
rápida, cobrando para vencermos sempre. Eddie Vedder diz na letra “tudo bem,
ficar sozinho, ficar quieto, dizer não, ser uma decepção na sua própria casa,
tudo bem desligar tudo, ignorar as regras do estado, é por você mesmo”.
“Seven O’Clock” é uma das melhores faixas de
Gigaton, tanto musicalmente quanto em relação à letra, e poderia muito bem colocá-la
na lista de melhores da banda. Uma letra fluindo rápido e sempre com novas
imagens e reflexões que clamam para que trabalharmos juntos para transformar
essa situação fudida em que nos achamos, sem tempo para depressão ou hesitação autoindulgente.
Na letra, várias indiretas para Trump e uma mensagem: “much to be done”.
Em “Never
Destination” e “Take The Long Way” o hard rock clássico da banda retorna com
satisfação. “Buckle Up” é bem leve e agradável e prepara caminho para a
extremamente emotiva “Comes Then Goes”, claramente uma homenagem ao amigo de
longa data da banda, Chris Cornell, que morreu em 2017. Só Eddie e o violão
exalando emoção. “Retrograde” e “Rivercross”, as quais falam com preocupação
sobre as mudanças climáticas, mantém o clima calmo e introspectivo e finalizam
o álbum.
Muito mais do
que ficar querendo colocar em que posição o novo disco vai ficar na carreira de
Pearl Jam, o melhor a fazer é comemorar que rock ’n’ roll com consciência e
propósito como esse ainda é feito hoje em dia, o que o torna muito mais
relevante do que muita coisa que vem sendo produzida ultimamente.
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