Alguns músicos cravam seus nomes
na história da música tanto pelo seu trabalho produzido quanto pelos serviços
prestados de preservação cultural. É o caso da tríade britânica que mudou os
rumos do blues na década de 60. John Mayall, Eric Clapton e Rolling Stones
(Mick Jagger e companhia) foram os principais responsáveis por (re)apresentar o
gênero do blues para o grande público branco dos Estados Unidos. Até então, o
blues era uma manifestação cultural da comunidade afro-americana altamente
centralizada nas áreas rurais do Sul dos Estados Unidos e nos bairros negros
dos grandes centros industriais do Norte. Após a invasão britânica, os brancos
passaram a consumir o blues tanto – ou mais – do que a própria população negra,
cujo interesse musical fragmentava-se diante dos gêneros derivados do blues e
jazz, como o soul e funk. Já tendo seus nomes marcados na história, Mayall,
Clapton e, em partes, os Stones, no entanto, permanecem ativos.
Tocando blues
há 70 anos – e profissionalmente há 50 -, John Mayall, o “Godfather of The
British Blues”, –, apenas um ano após o último álbum, A Special Life, mostra
que, aos 82 anos, ainda permanece com um fôlego interminável e lança seu mais
novo disco, chamado Find a Way To Care, no qual mostra uma habilidade
específica que não havia ainda sido muito explorada; com a ajuda da banda que o
acompanha há anos, com uma seção de metais sempre presente, John Mayall sente-se
confortável o suficiente para dedicar-se mais ao piano e ao teclado. Na verdade, o teclado e/ou piano são os
instrumentos de mais destaques de Find a Way To Care. De uma forma ou de outra,
dividindo o espaço seja com guitarras, gaita e metais, através de solos ou
apenas acompanhamentos tímidos, o teclado e piano estão sempre lá marcando presença.
É o caso de “The River’s Invitation”, na
qual seção de metais faz um belo trabalho, apoiando Mayall em seus vários solos
de teclado, que continuam em “Ain’t No Garantee”, com um ritmo mais para o
funk, puxado pelo baixo; em “I Feel So Bad”, clássico de Lighnin’ Hopkins, que
é totalmente repaginada por Mayall e tocada numa versão mais agitada e dançante,
com mais uma presença marcante dos metais e do teclado.
Mayall também
é conhecido por explorar nas composições próprias um pouco mais além o campo lírico do blues, indo além
de lugares-comuns do gênero. A faixa que dá título ao álbum, “Find a Way To
Care”, possui letras bem reflexivas, sobre mudanças sociais recentes e a
necessidade de continuarmos tentando: “times are changing now, we gotta do the
best we can”. Uma tentativa de colocar um pouco de otimismo nesse nosso mundo
desolado em que vivemos. Para um artista
de 80 anos, pode-se dizer que Mayall já viu mudar muita coisa. “Long Summer
Days” é nostálgica, com Mayall retomando suas memórias da infância na fazenda
na Inglaterra.
Os outros
destaques utilizam a fórmula mais tradicional do blues: gaita, piano, guitarra.
“Mother In Law Blues” inicia o álbum com extrema elegância e qualidade, com uma
letra clássica do blues sobre despedidas e abandonos, através de uma mecânica
bem interessante entre gaita, guitarra e piano. No meio de versos característicos do blues
(como “it was early in the morning” e “saw my baby walk away”), Mayall ainda
cria algumas imagens poéticas, como no trecho: “I know she heard me calling she
looked back and waved her hand / she said ‘I’m so sorry baby, you’re just
footprints in the sand’”. Em relação à voz, Mayall mostra que ainda consegue
cantar com vigor e intensidade. A versão para “Long Distance Call”, do lendário
Muddy Waters é outro exemplo: em grande parte mantendo-se fiel à original,
Mayall nos entrega uma versão honesta e impecavelmente executada, utilizando-se
dos solos para dar seu toque especial, dessa vez no piano. Na maliciosa “I Want All My Money Back” Mayall
se defende das aproveitadoras de plantão “you’re using me, i think you’re just
using me, if you don’t do something I like I want all my money back”. Outra
cover magnífica executada por Mayall e sua banda é “Drifting Blues”, também uma
das preferidas de seu amigo conterrâneo e guitarrista, Eric Clapton. John
Mayall finaliza de forma solitária, com a faixa “Crazy Lady”, só ele e o piano,
de acordo com a longa tradição de pianistas de New Orleans, como Professor
Longhair.
Tal qual Leo
“Bud” Welch, dois álbuns em dois anos para um músico com mais de 80 anos é algo
extraordinário. No caso de John Mayall é ainda mais surpreendente pelo fato do músico já estar há mais de 50 anos no ramo profissionalmente. Não é um álbum que se equipare aos clássicos da década de 60 e
70, tanto pela sua importância musical e histórica, mas para quem acompanha e é
fã da extensa carreira de John Mayall é com certeza uma ótima pedida.
postagem maravilhosa gostei muito amo blues
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