Algumas
decisões importantes normalmente são tomadas até certo ponto da vida. Nos
chamados anos formativos é que as pessoas decidem o que vão fazer da vida e a
partir daí seus esforços são feitos em torno dessa escolha. No mundo da música
é comum vermos nas biografias que os artistas começaram a aprender guitarra na
mais tenra infância. A maior parte dos bluesman começou dessa forma; ainda
criança alguém da própria família comprava-lhes uma guitarra e eles aprendiam a
tocá-la ouvindo outros bluesman no rádio ou em disco. Esse roteiro não serve,
no entanto, para “Daddy” Mack Orr, natural de Como, Mississipi, que completa 70
anos com o lançamento do novo álbum de sua banda, Daddy Mack Blues Band,
chamado A Bluesman Looks at Seventy.
Mack Orr
aprendeu a tocar guitarra apenas aos quarenta e cinco anos e, nos últimos 25
anos de sua vida, tem se dedicado a tocar blues pelo mundo afora (antes de
iniciar a carreira de bluesman, Mack Orr apenas conhecia quatro lugares –
Wisconsin, Kansas City, Chicago e Jackson). A Bluesman Looks At Seventy é o
sétimo disco da banda e, sem dúvida, um dos mais vigorosos. Mack Orr chega aos
setenta com uma voz expressiva, acompanhando a energia nostálgica que flui de sua
banda. Antigo coletor de algodão, que passou a trabalhar como mecânico de carro,
Mack Orr possui aquela experiência de vida no duro e cruel Sul rural, o Deep
South. É quase como uma lei; aqueles que possuem essa ligação tocam um blues
autêntico e honesto, ou seja, sabem exatamente do que falam – preocupação com
dinheiro, mulheres, trabalho, os assuntos preferidos do blues. As músicas são
compostas por Eddie Dattel, fundador da Inside Sounds, e Wally Ford, mas Mack
Orr consegue torná-las suas pela autenticidade.
Os destaques,
dentre as 14 faixas do disco, ficam com a festeira “Champagne Fantasy”, que
abre o disco, já que Orr afirma que “everyday is Friday and everyday is New Year’s
Eve”. “Muddy Waters”, mostra situações de injustiças raciais, como passar vinte
anos na prisão por um crime que não cometeu, dentre outras, nas quais Orr
afirma “if that ain’t blues, my friend, then Muddy Waters wasn’t black”. “Fix
it When I Can”, mais funky, foi inspirada no trabalho de Mack Orr como mecânico
de carros. Engana-se quem acha que aos setenta não se pense mais em sexo
casual, como em “You Don’t Have to Love Me”. A jogatina e o blues estão
totalmente interligados e “Gambling House” representa essa relação de jogar até
o dinheiro acabar.. “Hoodoo Blues” resgata a magia, as superstições e feitiços
da comunidade afro-americana do Sul dos Estados Unidos. Os compositores Dattel
e Ford entregaram de presente para Orr “I Like Fishin’”, já que este é o seu
hobby favorito. “Pocketful of Blues” é, como o próprio título já sugere, puro
blues de uma pessoa que sabe onde está se metendo.
A
autenticidade é tudo na tradição do blues. Quando encontramos um álbum como A
Bluesman Looks At Seventy, vemos que o blues está forte e seguro, tal qual
Daddy Mack Orr com seus setenta anos – e contando.
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